Quando uma visita domiciliar nos faz refletir

Estávamos no terceiro ano do curso, começando a visualizar na prática alguns conceitos já estudados.

Naquele dia, iríamos visitar um paciente acamado, com o intuito de colher o máximo de informações acerca da vida e de seus antecedentes. Chegando à residência, a filha do senhor se identificou e nos recebeu, ainda na aérea externa.

Ficamos por vários minutos coletando toda a história familiar, inclusive o que fez com que o pai dela se tornasse acamado. Ela contou que passou a cuidar dele depois que sua mãe faleceu, mas que seu pai já estava acamado há mais de 20 anos, em decorrência de um AVC. Eu, como estudante de medicina, já imaginei que ele provavelmente teria alguma doença de base, mas não. Quando a questionei sobre o histórico patológico, fui informada de que não havia. A única “comorbidade” que seu pai teve foi fumar e, a partir disso, elaboramos a hipótese de que esse foi o possível desencadeante do AVC.

Após colher todas as informações necessárias, meus colegas e eu fomos examinar o nosso paciente.

Durante o exame físico, fiquei admirada com a quebra da minha baixa expectativa em relação ao estado de saúde dele. Encontramos um idoso assistindo seu canal de tv religioso predileto, muito melhor do que eu imaginei tanto fisicamente quanto mentalmente.

Como podia, quase 90 anos de idade e acamado há quase 30 anos, não ter lesões ou patologias associadas?

Estava hidratado e nutrido, muito bem corado, sem nenhuma irregularidade ao exame físico. Brincou conosco e segurou meu braço enquanto fazia sua ausculta, o que fez lembrar meu avô.

Saí daquela visita emocionada, por ver num paciente um pouquinho de um ente querido já falecido, e reflexiva sobre a grande relevância de uma boa rede de apoio e da religião, algo que nem sempre nos damos conta.

Bruna de Figueirêdo Santana