Ela tinha o mesmo nome da minha avó
- integralizablog
- 26 de mai. de 2023
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Certa feita discutia com um tio que fazia tratamento para um câncer de tireóide sobre os nomes dos meus filhos, e ele me falava: nunca dê o nome de ninguém ao seu filho como homenagem, deixe que eles façam sua própria história.
Passaram-se anos, ele faleceu; ainda não tive filhos, mas essa paciente me trouxe a clara memória do que ele tinha me dito.
LSS, 43 anos, casada, mãe, trabalha como cuidadora da sogra, além de cuidar de sua filha de 16 anos, sua casa e seu marido: sobrecarregada de funções, sem qualquer vaidade ou autocuidado. E ela tinha o mesmo nome da minha avó que, aos 43 anos, também estava casada, era mãe, cuidava de sogra, dos filhos, da casa e de seu marido; ela também não era vaidosa.
Elas também dividem uma empatia estratosférica, o cuidado de mãe que extrapola o que somos capazes de oferecer, mesmo sabendo que não existem limites para o amor de uma mãe. A minha paciente temia pela sua saúde, não pelo desconforto de um agravo, pelas limitações e inseguranças de um diagnóstico ou pela sua vida, pensava apenas em como ficariam seus dependentes se ela não pudesse cuidar deles. O medo, como uma emoção básica de proteção, já tomava conta de tudo aquilo que ela fazia.
Cresci conhecendo e reconhecendo a difícil trajetória da minha avó, buscando desviar dos caminhos que me levassem a viver da mesma forma tão dura como ela viveu. Apesar disso, tenho trilhado um percurso semelhante: temo pela vida do meu pai como se fosse minha, temo pelo vestibular da minha irmã como se fosse meu, temo pelo trabalho da minha mãe como se eu o fizesse. Assim como elas, estava sendo simpática: sentido aquilo que compete ao outro e não a mim; responsabilizando-me por eles e não por mim.
Mas como seria possível? Na bagagem, 4 anos e meio de análise de terapia cognitivo-comportamental antes dos 20, yoga, fé, oração, missa e, sobretudo, o filme da vida real que pude e, felizmente, posso acompanhar. Como eu não tinha percebido que estava a trilhar a mesma estrada de tijolos amarelos?
Foram necessárias nove histórias dentro de 3 meses, um trabalho intensivo, para que eu me desse conta daquilo de que o exemplo a não ser seguido estava dentro de mim. Precisei encarar as dores da minha paciente e buscar resolvê-las, como forma de curar as minhas: as que tenho e as que não quero ter, seja aos 43, seja aos 88 anos como a minha avó.
Meu tio não estava de todo certo, não tenho o mesmo nome da minha avó, mas foram elas que me abriram o coração para o meu novo caminho.
Manuela Leitão Nunes
Me emocionei. Que lindo!
Muito bom